Dentre os tipos de pessoas de minha cidade,
popularmente conhecidas por suas atitudes estranhas, destaca-se uma senhora
negra que perambula principalmente na área central, sempre vestida de branco
com vestido longo e óculos escuros.
Com passos vagarosos, caminha em
silêncio e um tanto contemplativa, em profunda observância às pessoas e coisas
circundantes, causando curiosidade a todos. Não se vê esta senhora conversando
com alguém ou sentada, e suas paradas são raras e sempre muito rápidas.
Em seu habitual percurso, esta
mulher de branco chega a parecer um anjo permeando entre os apressados passos
dos transeuntes. Parece ter aprendido a deixar a vida fluir abundantemente à
sua volta, não se importando com o que os outros possam pensar a seu respeito.
Afinal todos pensam bem ou mal a nosso respeito de qualquer maneira.
Partindo desta premissa, logo
podemos tirar daí um sábio ensinamento. Desde que temos consciência de nosso
reto pensar e, por conseguinte, não estamos prejudicando quem quer que seja,
não há necessidade de sermos tão coerentes sempre. Podemos agir como desejamos
e até mudarmos de opinião, sem que possamos nos envergonhar disto.
Parece que esta senhora, absorta
em seus pensamentos não sente no âmago qualquer mágoa que possa acorrentá-la ou
a angústia da solidão dilacerando suas vísceras.
Tendo-a observado por alguns
segundos num destes dias em que me desfaço de toda e qualquer tribulação e
deixo a poesia universal preencher a minha alma, conclui, sobretudo, que muitos
são os que se julgam perfeitos, superiores aos demais em razão de suas posses,
cultura e sociabilidade, outros negam este perfil humano de autoridade por
sabê-lo transitório, passageiro e inconsequente. Pensei também naqueles que têm
dúvida a respeito e acham que pode ser necessário certa exaltação e glamour
quando se consegue a graça de uma vitória sobre os semelhantes. Por fim, a
minha conclusão foi tácita: todos nós, agindo ou não como a mulher de branco,
sendo loucos ou sábios, haveremos, um dia, cedo ou tarde, cada qual à sua
maneira,de nos aproximarmos de Deus
Esta mulher de branco, talvez, no
mundo só dela, tenha um sonhar simples que o coração acalenta com a mesma
meiguice com que contempla o carinho dos cachorrinhos que rosnam para ela
amorosamente, no jeito das pessoas que carregam sorrisos em vez de choros e
vice versa.
Enfim, consciente ou não, insana
ou lúcida, ela consegue transmitir o espetáculo amorável de pureza, serenidade
e singeleza. E os perfis assim, angelicais, conseguem fazer com que a vida seja
esculpida sempre em transcendental
poesia.
Autoria: Antenor Rosalino
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