segunda-feira, 18 de setembro de 2017

E AGORA, JOSEPH?



  Durante a realização de uma das mais famosas e tradicionais exposições agropecuárias do país, que reúne grandes pecuaristas até do exterior, um fazendeiro expositor, já dentro dos seus setenta e três anos de vida, estando à sós num determinado momento observando melhor o ambiente diversivo, visualizou uma linda jovem esbelta, de olhos esverdeados aparentando não mais que trinta anos de idade. A moça não estava acompanhada; usava calça jeans e blusa azul clara rendada, o que tornava ainda mais belo o seu corpo escultural e o balançar do seu andar calmo e extremamente sensual. Ao vê-la entrar numa lanchonete próxima onde pediu um refrigerante, o fazendeiro, encantado, aproximou-se da moça e foi logo se declarando:
   - Boa tarde, sou Joseph. Posso saber seu nome? – Entreolharam-se por alguns segundos e, prontamente, a jovem respondeu:
  - Joanita. Você é expositor?
  - Sim – arrematou Joseph. – Deram-se as mãos e prosseguiram a conversa com interrogações recíprocas.
  Joseph, tal qual Joanita, não possuía educação apurada, mas o ancião demonstrava ser bem humorado. Era divorciado e deu a entender à jovem que era possuidor de muito dinheiro. Isso bastava. Era tudo o que Joanita sempre quis.
  Marcaram novo encontro e iniciaram um namoro que, para ele, era arrebatador.  Joanita, por sua vez, só se interessava por dinheiro. Os encontros foram se sucedendo e, quando ambos estavam juntos, Joanita não se preocupava em comportar-se como uma dama e tinha o hábito de lançar olhares maliciosos e interesseiros a qualquer rapaz que lhe despertasse alguma atenção.
  Certo dia, Joanita apresentou sua melhor amiga ao fazendeiro. Os três passearam, conversaram animadamente, mas logo Joseph teve de deixá-las devido aos compromissos.
  No dia seguinte, Joanita dirigiu-se a um banco com a mesma amiga. Coincidentemente, Joseph também foi ao mesmo banco e, a princípio nas as viu. As duas amigas desceram de um elevador e Joseph de outro. Ao reconhecê-las, Joseph apressou os passos para lhes dirigir a palavra, mas foi o tempo suficiente para que ouvisse a amiga dizer a Joanita:
  - E você, amiga, vai conseguir ficar com aquele velho feio? – Joseph, decepcionado, deteve-se para não ser reconhecido e não lhe foi possível ouvir a resposta de Joanita.
 Passaram-se os dias. Joseph nada comentou a respeito do episódio que o deixara profundamente magoado e os encontros continuaram apesar dos mais de quarenta anos de diferença de idade entre ambos.
  Ao aproximar-se o fim da exposição, Joseph lembrou-se de que havia informado à Joanita que completaria setenta e quatro anos no último dia da exposição. O fim do evento estava chegando rápido e como a noite avançava e Joanita não o cumprimentava pelo aniversário, Joseph, entristecido perguntou à linda jovem:
  - Joanita, você seria capaz de esquecer o dia do aniversário de quem você gosta? – A resposta de Joanita foi firme e tácita:
  - Absolutamente não, Joseph. - E continuou: - Quem esquece o dia mais importante da vida de quem diz gostar é porque não gosta mesmo. Eu nunca me esqueço, nem mesmo do aniversário do meu cachorrinho, aliás, hoje é aniversário dele.



Autoria:  Antenor Rosalino

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quinta-feira, 14 de setembro de 2017

O BEIJO


                                                               


O reinado labial
Em frenesi de êxtase
Transcende e se faz luz
Em misteriosas e belas
Experiências de vida
Pelo amor que o conduz.

A carência do beijo
Lateja nas células!
Os lábios carmesins
Se entreabrem à espera
Da partilha que enternece
O que a paixão apetece.

A ansiedade domina
Os corpos ardentes
Na volúpia do instante
Que eterniza as lembranças
Na amplidão dos luares
E nos perfume dos cântaros.

Suprema ternura
Que se apossa inefável
Das profundezas do âmago
E nos olhares risonhos
Onde as bocas uníssonas
Consolidam os sonhos.


Autoria: Antenor Rosalino

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quinta-feira, 7 de setembro de 2017

AS LEITURAS DE MARIA


                                                             


 Descontraído, ao sair de um shopping, meu olhar se perdia pelo circunstancial até encontrar, na calçada, uma pobre mulher maltrapilha, acompanhada de um cachorro que demonstrava até alegria, contrapondo-se à tristeza estampada no rosto de sua dona.
  O que me surpreendeu e muito, foi o fato dessa mulher estar lendo um velho livro, entre as muitas quinquilharias ao seu redor.
  Comovido, procurei aproximar-me com o intuito de esperar por alguns instantes até que ela tirasse os olhos do livro para que eu pudesse lhe falar. Em poucos minutos isso aconteceu. Então, quando estava pronto para lhe dirigir a palavra ela me fitou com firmeza, mas demonstrando melancolia e disse:
  - Êta! Lá vem mais um pra debochá só porque tô lendo. – Ao mesmo tempo, foi posicionando-se para sair quando lhe interpelei, calmamente, dizendo:
  - Minha senhora, pelo contrário, gostaria de te elogiar, procurar saber o que estava lendo, saber o teu nome, enfim, a gente poderia conversar um pouco. Gosta muito de ler?
  Com essas palavras, consegui persuadi-la a ficar. Então, para minha surpresa, ela dirigiu-me longa resposta, afirmou chamar-se Maria dos Anjos e que a leitura era o seu maior prazer, pois a levava para o mundo no qual ela vivia de fato, distante da Terra onde as pessoas dificultam as coisas e deveriam ser mais caridosas entre si.
   Quanto ao livro, disse-me tê-lo encontrado no lixo assim como outros que possuía. Tratava-se do antigo livro de autoajuda: “Como fazer amigos e influenciar pessoas”, de Dale Carnegie. É um belo livro que, como o próprio titulo diz, traz preciosos ensinamentos sobre o trato com as pessoas e o valioso poder de transformação que um incentivo pode proporcionar.
  Após a resposta, antes que eu pudesse saber mais sobre ela, ajudá-la de alguma forma, orientá-la para alguma entidade beneficente de assistência social, ela se foi de forma repentina, dizendo-me por fim: “o senhor é um homem bom”.
  Fiquei, então, pensativo imaginando o quanto me proporcionou reflexão aquele inesperado encontro. A misteriosa mulher tinha mistura de cabelos pretos e grisalhos, possuía ostensivas rugas, mas possuía traços bonitos, rosto angelical e olhos claros. O que a teria feito viver daquela forma? O que ela desejou dizer ao insinuar que seu mundo era outro? E como pode um livro tão valioso e ainda em bom estado de conservação ir para o lixo?
  Eram muitas as minhas indagações silenciosas, mas o que mais me intrigou foi o fato de que, ao mesmo tempo em que o livro fora abandonado por alguém, por outro lado, outra pessoa comprovava o quanto a leitura é valiosa e interessante, fazendo-a, até mesmo, voejar num mundo diferente. Ou Maria pertencia mesmo a outro mundo? São tantos os mistérios que nos permeiam...
E por muitas esquinas vagueiam tantas outras Marias dos anjos e santas, ao sopro do vento, esquecidas ao nada, como se estivessem apenas passeando pela Terra, sob a acalentura do sol e a luz do prado.


Autoria:  Antenor Rosalino
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