Tão dócil como
a própria melodia,
ecoava o canto de Celita
pelos ventos brandos
magnetizando o infinito!
Celita nasceu cantando? Esta pergunta era frequente em relação à
franzina, mas linda menina, desde os primórdios de sua infância, quando a
suavidade de sua voz se fazia ouvir por toda a casa.
O desejo maior de Celita era cantar. Nada
fazia sem cantarolar. E isso era frequente desde o alvorecer até o fim de cada
dia. Parecia respirar melodias e até
sonhava cantando em palcos iluminados pelas centelhas coloridas das ribaltas.
Era como se o universo a saudava e o sol e as
estrelas energizavam-se ao vê-la cantar.
Com o passar do tempo, já mocinha, não eram
raras às vezes em que Celita era convidada a cantar em festas de amigos e ela
nunca recusava os convites, pelo contrário, recebia-os alegremente e se
dispunha a se apresentar com sua fascinante originalidade, beleza altiva,
faceira e cativante brilho no olhar.
Assim, o talento da meiga e ingênua mocinha
foi ganhando notoriedade, até que um dia foi lhe apresentado um produtor
musical que, entusiasmado com a afinada e linda voz de Celita, convidou-a de
pronto, a se apresentar num show que seria promovido brevemente, naquela mesma
cidade, para o qual viria também uma famosa banda da capital.
Sem titubeios e com a aprovação dos pais, o
convite foi aceito e, a partir de então, foram sendo providenciados todos os
requisitos e o repertório para aquela particularidade musical.
Os dias foram sucedendo-se velozmente e,
enquanto isso, Celita cantava... Mais do que nunca, cantava! E seus olhos
brilhavam, enquanto o seu corpo, num magneto de divina beleza, fazia ternos
movimentos, em unicidade com o encantamento de sua voz. E isso ocorria a
qualquer instante e em qualquer lugar. Seus pais até foram aconselhados a
levarem-na a um psicólogo, mas desistiram da ideia. Afinal, que mal havia em
cantar? Além disso, o canto da menina nunca foi empecilho para o cumprimento de
seus deveres. Era uma filha exemplar, assídua em suas obrigações em casa e na escola,
e sempre muito querida por todos.
Por fim, chegou o dia do esperado espetáculo.
Na cidadezinha engalanada, só se ouvia comentários otimistas sobre a
apresentação de Celita.
O anoitecer chegou sobre folguedos e
alegrias. A única casa de espetáculos do lugar já estava com a lotação
esgotada. E ainda havia muita gente do lado de fora, em esperança de ouvir a
envolvente pureza das interpretações, que, sem dúvida, seriam de inenarrável
beleza e ternura.
Ao iniciar o espetáculo, a expectativa maior
da alucinante plateia não era destinada ao conjunto vindo da capital, mas sim,
para Celita que, certamente, iria encantar a todos com sua graça e voz que
magnetizava a todos que tivessem o privilégio de ouvi-la.
Celita adentrou ao palco extremamente
impressionada com todo aquele aparato e foi aplaudida o tempo todo. E quanto
mais se avultavam os aplausos, mais a menina encantava deslizando divinamente
no palco. Ela se sentia em estado de
êxtase e fascinada com tudo ao seu redor!
A magistral apresentação de Celita ofuscou
flagrantemente o show da banda . E isso fez com que ela fosse muito aplaudida
não só pelos leigos, mas também pelos críticos, resultando daí, um convite para
que participasse de um programa musical
que já fazia sucesso nas tardes dominicais na capital.
O convite foi aceito e, um mês depois, partia
Celita para alçar voos que a levariam ao apogeu da glória e da fama. E foi isso
o que ocorreu. Antes de sua partida, porém, um fato inusitado chamou a atenção
de toda a população da cidadezinha. Em muitas fotos tiradas quando da
apresentação do show, algumas pessoas notaram que os pés de Celita não tocavam
o chão. Estava claro que ela levitava. O caso repercutiu e isso fez com que o
sucesso da jovem cantora crescesse ainda mais.
Assim, Celita foi se destacando nos palcos,
em vídeos e em jornais. E as bilheterias superfaturavam em suas apresentações
nas grandes metrópoles.
O tempo foi passando e o inevitável sucesso
acompanhou Celita por toda a sua vida. Viveu cantando pela vida afora. E ela
tinha conhecimento da intuição de sua própria existência.
Celita vivenciou a glória e cantou até o fim
de seus dias. Mas a fama nunca teve importância em sua vida. O que ela desejava
mesmo era cantar em qualquer circunstância. Faleceu ainda jovem, vitimada por
um ataque cardíaco, enquanto cantava pelos jardins floridos de sua casa. E,
mesmo ao despedir-se da vida, as pessoas que a acudiram afirmavam que dos
lábios de Celita soava um leve canto que se confundia com o som orquestrado dos
pássaros numa harmonia de divinal e indizível esplendor, que preenchia os
vazios daquela tarde sombria.
Celita
expirou cantando.
Autoria: Antenor Rosalino
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