Defronte a um pequeno espelho, mas não
tão pequeno que não me fosse possível perceber com nitidez, as profundas rugas
impostas pelas minhas já ultrapassadas seis décadas de vida, pude contemplar
também nesse momento de rara reflexão, a minha outra face inocente e pura que a
alquimia do espelho insiste em ocultar.
No íntimo, bem nas entranhas das minhas vísceras, permeia a pureza e a
ingenuidade do meu verdadeiro ser. Este sim é o meu melhor retrato, distante da
Terra tristonha e poluída, que me trouxe rugas ostensivas, decorrentes do tempo
sempre implacável.
Assim, fora do espaço terrestre, essa minha fisionomia oculta vive a
eternidade do tempo enquanto os meus olhos retratam os ocasos da vida – ora
como névoas do passado, ora como bruma invisível no presente -, um viver
repletos de experiências boas e ruins.
Na quietude desse momento reflexivo, o meu pensamento foi despertado
para os mistérios, as surpresas e os acasos a que estamos sujeitos a todo e
qualquer instante.
Nesta sensória introspecção, relembrei-me de quando eu ainda era quase
uma criança, e na minha pureza e inocência de então, acreditava num mundo
igualmente destituído de violência, egoísmo e desamor. Era como se o mundo
respirasse o meu espírito e a vida deslizasse como um sonho...
Com o transcorrer do tempo, conscientizei-me
de que a vida segue no seu veloz compasso, fazendo estruturas piramidais em
todas as esferas de seu domínio. Quando estamos num nível baixo, mantemos as
mesmices de situações irrelevantes, sem observarmos perspectivas grandiosas e
atemporais, mas quando estamos nivelados no topo ou próximo ao mesmo, notamos a
diferença entre as coisas e entre as pessoas em suas diversidades de propósitos
e sentimentos.
Ao participar da tão agradável, salutar e interessante experiência
chamada Escrevivência – um curso que, na verdade, é uma terapia -, pude
perceber com bem mais precisão e objetividade, a diferença abismal que existe
entres as pessoas: existem as sapientes, dotadas de comovente simplicidade e
propósitos elevados que sempre marcaram suas vidas, como demonstraram ser todos
os amigos e amigas deste maravilhoso projeto, contrariamente àqueles que
simplesmente passam pela vida, sem deixar rastilhos de construtos admiráveis e
exemplos a ser seguidos.
A minha realidade, tal qual o pequeno espelho que me inspirou a esta
narrativa, revela apenas as nódoas da idade cronológica, mas não revela
verdadeiramente quem eu sou.
Por trás do meu riso, às vezes até atrevido, aninham-se momentos
felizes, de alegria invulgar em vários aspectos, mas também com profundidade e
sem desfaçatez, ostenta a minha origem humilde e um pranto de dor vagueia nas
lembranças do meu viver como órfão de pai desde os sete anos de idade,
aflorando em minha mente todo o sacrifício da minha mãe para me criar dentro
dos princípios morais, com os mesmos sentimentos fraternos e de retidão que
sempre nortearam a vida dela e do meu pai.
Em síntese, o espelho ostenta apenas a realidade presente, passageira e
transitória do viver terreno; não revela que a minha fisionomia brilha do outro
lado da vida, onde o meu verdadeiro ser envolto em laivos de poesia, vive a sua
vida eterna.
Autoria: Antenor Rosalino
Imagem da internet
Boa tarde, Antenor. Um texto verdadeiro e muito bonito. Com certeza, sua vida tem sido um belo caminho. Parabéns!
ResponderExcluirBoa tarde, Ana. O texto é, de fato, verdadeiro e falo com pureza de sentimentos, quanto a ser bonito, atribuo o elogio à sua generosidade de amiga. Obrigado, sempre.
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