domingo, 15 de fevereiro de 2015

CANTANDO A VIDA




                                                       


                                  
                                                 Tão dócil como a própria melodia,
                                                         ecoava o canto de Celita
                                                        pelos ventos brandos
                                                       magnetizando o infinito!


  Celita nasceu cantando?   Esta pergunta era frequente em relação à franzina, mas linda menina, desde os primórdios de sua infância, quando a suavidade de sua voz se fazia ouvir por toda a casa.    
  O desejo maior de Celita era cantar. Nada fazia sem cantarolar. E isso era frequente desde o alvorecer até o fim de cada dia.  Parecia respirar melodias e até sonhava cantando em palcos iluminados pelas centelhas coloridas das ribaltas.
  Era como se o universo a saudava e o sol e as estrelas energizavam-se ao vê-la cantar.
  Com o passar do tempo, já mocinha, não eram raras às vezes em que Celita era convidada a cantar em festas de amigos e ela nunca recusava os convites, pelo contrário, recebia-os alegremente e se dispunha a se apresentar com sua fascinante originalidade, beleza altiva, faceira e cativante brilho no olhar.
   Assim, o talento da meiga e ingênua mocinha foi ganhando notoriedade, até que um dia foi lhe apresentado um produtor musical que, entusiasmado com a afinada e linda voz de Celita, convidou-a de pronto, a se apresentar num show que seria promovido brevemente, naquela mesma cidade, para o qual viria também uma famosa banda da capital.
  Sem titubeios e com a aprovação dos pais, o convite foi aceito e, a partir de então, foram sendo providenciados todos os requisitos e o repertório para aquela particularidade musical.
  Os dias foram sucedendo-se velozmente e, enquanto isso, Celita cantava... Mais do que nunca, cantava! E seus olhos brilhavam, enquanto o seu corpo, num magneto de divina beleza, fazia ternos movimentos, em unicidade com o encantamento de sua voz. E isso ocorria a qualquer instante e em qualquer lugar. Seus pais até foram aconselhados a levarem-na a um psicólogo, mas desistiram da ideia. Afinal, que mal havia em cantar? Além disso, o canto da menina nunca foi empecilho para o cumprimento de seus deveres. Era uma filha exemplar, assídua em suas obrigações em casa e na escola, e sempre muito querida por todos.
  Por fim, chegou o dia do esperado espetáculo. Na cidadezinha engalanada, só se ouvia comentários otimistas sobre a apresentação de Celita.
  O anoitecer chegou sobre folguedos e alegrias. A única casa de espetáculos do lugar já estava com a lotação esgotada. E ainda havia muita gente do lado de fora, em esperança de ouvir a envolvente pureza das interpretações, que, sem dúvida, seriam de inenarrável beleza e ternura.
  Ao iniciar o espetáculo, a expectativa maior da alucinante plateia não era destinada ao conjunto vindo da capital, mas sim, para Celita que, certamente, iria encantar a todos com sua graça e voz que magnetizava a todos que tivessem o privilégio de ouvi-la.
  Celita adentrou ao palco extremamente impressionada com todo aquele aparato e foi aplaudida o tempo todo. E quanto mais se avultavam os aplausos, mais a menina encantava deslizando divinamente no palco.  Ela se sentia em estado de êxtase e fascinada com tudo ao seu redor!
  A magistral apresentação de Celita ofuscou flagrantemente o show da banda . E isso fez com que ela fosse muito aplaudida não só pelos leigos, mas também pelos críticos, resultando daí, um convite para que  participasse de um programa musical que já fazia sucesso nas tardes dominicais na capital.
  O convite foi aceito e, um mês depois, partia Celita para alçar voos que a levariam ao apogeu da glória e da fama. E foi isso o que ocorreu. Antes de sua partida, porém, um fato inusitado chamou a atenção de toda a população da cidadezinha. Em muitas fotos tiradas quando da apresentação do show, algumas pessoas notaram que os pés de Celita não tocavam o chão. Estava claro que ela levitava. O caso repercutiu e isso fez com que o sucesso da jovem cantora crescesse ainda mais.
  Assim, Celita foi se destacando nos palcos, em vídeos e em jornais. E as bilheterias superfaturavam em suas apresentações nas grandes metrópoles.
  O tempo foi passando e o inevitável sucesso acompanhou Celita por toda a sua vida. Viveu cantando pela vida afora. E ela tinha conhecimento da intuição de sua própria existência.
  Celita vivenciou a glória e cantou até o fim de seus dias. Mas a fama nunca teve importância em sua vida. O que ela desejava mesmo era cantar em qualquer circunstância. Faleceu ainda jovem, vitimada por um ataque cardíaco, enquanto cantava pelos jardins floridos de sua casa. E, mesmo ao despedir-se da vida, as pessoas que a acudiram afirmavam que dos lábios de Celita soava um leve canto que se confundia com o som orquestrado dos pássaros numa harmonia de divinal e indizível esplendor, que preenchia os vazios daquela tarde sombria.
Celita expirou cantando.



Autoria: Antenor Rosalino

Imagem da internet
  
                                                                            
                                                

                                                                  

2 comentários:

  1. Já tinha lido este conto, acho que no Recanto. Lindo demais!
    A melhor morte de todas deve ser esta, a de Celita.

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  2. Sim, Ana. Eu já tinha publicado este conto no Recanto, assim como todos os demais textos que posto aqui. Utilizo ambos os links para dar maior opção para aqueles que, iguais a você, me honram com suas leituras. Fico feliz com sua releitura e comentário. Muito obrigado, amiga.

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