sábado, 12 de julho de 2014

PAI E FILHO





  Os dias corriam sempre calmos e tranquilos na casa do Belizário, um caminhoneiro muito estimado e conhecido no bairro suburbano onde morava com a esposa Lucinda e seus dois filhos ainda crianças.
  Belizário era extremamente trabalhador, muito devotado à família e apaixonado por futebol. A sua vida pacata se resumia principalmente apenas nisso: ao trabalho em cuja empresa trabalhava há muitos anos, tendo se constituído num funcionário exemplar, assíduo em suas obrigações e líder em potencial, apesar de sua pouca escolaridade, à família unida e sempre feliz e em assistir os jogos do seu time favorito.
  Não eram raras as vezes em que, em dias de folga do trabalho, brincava alegremente com os filhos e parecia até mesmo uma outra criança, em vista do seu jeito extrovertido e brincalhão de ser.
  O elo afetivo que prendia o dedicado pai aos filhos e vice-versa era exemplar e admirável. A esposa já havia se habituado ao fato de ver a família atrasar-se para o almoço ou para o jantar, por conta das brincadeiras entre o esposo e os filhos.
  Num desses dias, porém, em que tudo parecia festivo e a vida transcorria como num eldorado de sonhos, Belizário interrompeu a brincadeira com os filhos, alegando não estar se sentindo bem. A atitude do caminhoneiro entristeceu as crianças e preocupou Lucinda, pois Belizário nunca havia se queixado, absolutamente, de nada. Pelo contrário, fazia sempre questão de dizer que possuía saúde de ferro.
   Sentaram-se todos ao redor de Belizário e, após a sugestão da esposa para irem ao médico, o marido recusou-se de forma veemente e, paulatinamente, foi melhorando o seu estado de saúde até que, tudo enfim voltou ao normal.
   No dia seguinte, logo após chegar ao trabalho, subitamente, outro mal estar veio aborrecer e preocupar o caminhoneiro. No serviço, julgando não ser conveniente contrariar o gerente da empresa, seguiu o conselho deste e foi levado ao médico que solicitou vários exames, já presumindo algo bem mais sério do que os familiares e amigos pudessem imaginar.
  Em poucos dias os exames foram concluídos. Nesse ínterim, outro mal estar seguido de intensa dor veio atacar o caminhoneiro, o que levou Lucinda a preocupar-se bem mais com o marido.
  Enfim, de posse do resultado dos exames, marido e mulher se dirigiram ao médico que, por sua vez, constatou ser o Belizário possuidor de uma doença rara, denominada ELA – esclerose lateral amiotrófica,  cuja doença vai consumindo o organismo do paciente em decorrência da degeneração da musculatura de forma rápida e avassaladora.
  E assim, o pobre caminhoneiro foi internado. Durante esse período, a esposa foi alertada pelo médico de que, infelizmente, Belizário teria pouco tempo de vida. E como nada mais poderia ser feito, após uma rápida internção, deram alta ao pobre homem para que ele passasse, na própria casa, ao lado da esposa e dos filhos, o pouco tempo de vida que lhe restava.
  O tempo transcorreu velozmente. As crianças perderam a alegria   característica dos seus olhos vívidos postergaram as brincadeiras de rotina. A família vivia entre penumbras tristes, na angustiosa expectativa do suspiro final de Belizário. Causava dor a quem visse as duas crianças do casal presenciando o inevitável definhamento do pai. Os olhos do mesmo se movimentavam como a desejar dizer algo e a consciência permanecia intacta.
   Numa tarde de verão, após intensa agonia, Belizário, já sem fala, lançou um olhar significativo à dedicada esposa e aos filhos e expirou.
  Passados alguns dias, um pouco mais resignada com tudo o que aconteceu, Lucinda encontrava-se na sala de estar com os filhos quando, o mais novo, repentinamente, com ostensiva inocência no olhar assim falou: “Mamãe, vou pedir para Deus me deixar morrer também, assim eu vou poder ver o papai e brincar com ele no céu”.



Autoria:Antenor Rosalino

Imagem da internet
 

  

2 comentários:

  1. Boa tarde meu querido amigo.

    Nossa, que narrativa mais emocionante!
    Felizes são os que estreitam os laços da paternidade, este pai se foi em matéria, mas, deixou um legado enorme de amor, tanto, que na inocência do filho, o desejo da partida para poder estar novamente junto.
    Nossa, de arrepiar... Parabéns!

    Um beijo imenso em teu coração, obrigada pelo momento.

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    1. Sem dúvida, Lu, são muito felizes os que estreitam esses laços afetivos e o legado deixado certamente fará com que o filho também haja com retidão por toda a vida. Beijo na alma e muito obrigado por tão gentil comentário.

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