domingo, 18 de setembro de 2016

O MITO DO ALCOOLISMO NA INSPIRAÇÃO





   Certo dia, fui interrogado por um jovem que desejava saber o motivo pelo qual alguns poetas parecem ser tomados por bem mais inspiração quando estão alcoolizados. O jovem perguntador fez, inclusive, algumas referências sobre grandes poetas do passado.
  O que penso e respondi a respeito foi o seguinte: sabemos que existem pessoas que possuem maior sensibilidade do que outras. Se essas pessoas vêem, ouvem ou leem algo que lhes desperta maior atenção, costumeiramente passam isso para o papel. Debruçam-se nos seus sentimentos e daí nasce o poeta!
   Sendo assim, quando as circunstâncias favorecem por algum motivo, principalmente quando o poeta se encontra introspectivo, surgem as inspirações.
  O álcool produz, para alguns, certos momentos de euforia, mas, para outros, contrariamente, causa melancolia. Em ambos os casos, podem surgir pensamentos líricos, porque a mente divaga em sonhos, mas não posso acreditar que o escritor busque a arte na bebida.
  Alguns escritores podem continuar escrevendo muito, até mesmo em estágios avançados de dependência alcoólica, mas isso tem a ver apenas com o talento, jamais com o vício, mesmo por que, o álcool não contribui para a criatividade, pelo contrário, corrói a função mental.
  Embora os efeitos do álcool tendam a variar de acordo com as características de cada pessoa, de um modo geral, quando é ingerida em pequenas quantidades causa certa desinibição, mas com o aumento gradativo da ingestão o indivíduo começa a apresentar dificuldade de resposta aos estímulos.
  Portanto, não vejo o alcoolismo como uma espécie de catalisador necessário à inspiração. Se o poeta ficar em casa e buscar reflexões, obterá o mesmo resultado que possa ter na mesa de um bar. O devaneio poético provém, unicamente, da introspecção que traz uma visão mais sólida e sensória do mundo e do circunspecto.
  É o vício que o leva para a rua, como acontecia com muitos poetas líricos e pensadores do passado, e não a necessidade de engrandecer o seu estro poético. Prova disso é que a poesia pode nascer na contemplação da grandiosidade do universo como também do simples desabrochar de uma flor, do sorriso de uma criança, do fascínio estelar, dos crepúsculos, da imensidão do mar... E alguém dominado pelo álcool, obviamente, se vê incapaz de observar a vida em flor. Pode até ocorrer alguns lampejos ou alucinações, mas não a vida em seu apogeu maior de luz e encantamento.
  Sabemos que um poeta lúcido, distante dos vícios, quando inspirado, não só encanta como parece transmutar o imaginário para o real, como a própria poesia em seus abstratismos assim o faz.




Autoria:  Antenor Rosalino

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